ANÁLISE - Halo Infinite (Campanha)

Os dois últimos anos foram algo estranhos, acho que é fácil concordar com esta afirmação. O mundo virado de pernas para o ar, meio paralisado, e obviamente a indústria dos jogos não passou incólume a isto. Projetos cancelados, outros lançados num estado lastimável e no meio disto Halo Infinite, com uma primeira revelação que deixou a internet em estado de sitio (em abono da verdade não é preciso muito). Claro que tinham passado então 5 anos desde o desastre que foi Halo 5, a pandemia não seria a culpada mas, depois do lançamento complicado do Master Chief Collection, do divisivo Halo 4 e do odiado Halo 5, só o mais otimista dos otimistas iria estar confiante que Infinite - entretanto adiado para 2021 - iria ser um triunfo, com a equipa a lutar para entregar um bom jogo nesta nova situação de trabalho a partir de casa e caos pandémico. 

Com o aproximar da data de lançamento, foram aparecendo as betas do multiplayer que revelaram uma jogabilidade sólida, mas jogabilidade nunca foi  problema mesmo no pior dos Halos. Chega então o aguardado 10 de dezembro, a reação dos media parecia bem favorável mas, estamos na era do hype e da informação viral, guardo para mim alguma desconfiança. Logo nos primeiros instantes temo o pior... Isto é o maior franchise da Microsoft, mesmo com todo o caos do desenvolvimento a expectativa é a de um produto final que reflita vir de um dos maiores players na cena e uma das maiores empresas a nível mundial. Em vez disto somos introduzidos ao jogo com uma cutscene que é  um desastre em termos de fluidez, com problemas de stuttering e frames perdidos juntamente com black levels mais cinzentos que negros. Honestamente pensei para comigo - cá vamos nós para um Cyberpunk - onde a realidade de muitas reviews e influencers contrastava com a realidade objetiva do produto final. Consigo aceitar a história atabalhoada e personagens mal amanhados - nada de novo em Halo - custa-me mais lidar com a falta de qualidade na entrega. Mas bem... começa o jogo e rapidamente grande parte das preocupações esfumam-se. O combate é bom, gráficos bonitinhos e com performance super fluida, excelente música com igual qualidade no feedback sonoro de cada arma que vou experimentando. Mas estes são os momentos iniciais, mais lineares, sei que há um open world à minha espera.

É uma pena a apresentação ao open world ser feita através de mais uma cutscene com performance miserável. Sinto a desilusão da minha Series X desejosa de fazer flex dos seus teraflops. Imagino que na cabeça de quem desenhou esta revelação estava um momento WOW - que realmente está lá - mas só dei por mim a pensar se iriam resolver este bug antes de eu terminar esta aventura, em vez de estar realmente a experienciar o momento. Para minha surpresa a performance em jogo é praticamente imaculada, percorremos o mundo a pé, de veículo, ou qual Homem-Aranha com o nosso grappleshot e a fluidez é total. Batalhas de variadas escalas, com explosões, mil e uma coisas a acontecer, e nada perturba Infinite. Isto até vir a próxima cutscene onde inexplicavelmente volta a tropeçar. 

Felizmente Infinite é um daqueles títulos onde a jogabilidade é o elemento central. Perde pouco tempo em momentos de narrativa ou exposição e muitas vezes quando o faz não nos retira o controlo. Sem dúvida uma boa opção, primeiro porque a história não é propriamente boa mas, principalmente porque no que toca ao jogo jogado este é o melhor Halo até à data. O que para uma série como Halo é dizer muito. 

Sou parcial a jogos em que a filosofia da sua construção se centra em torno do conceito de emergência sistémica, onde sinto que os momentos que ocorrem espontaneamente são meus e não do programador. Em Infinite frequentemente dei por mim a capturar vídeos porque algo inesperado e/ou divertido tinha acontecido e tornado um encontro memorável. Esta noção de que o campo de batalha é na realidade um recreio não é nova na série mas aqui todos os elementos estão melhores que nunca. O desenho do mundo e dos encontros, as armas e ferramentas disponíveis, a inteligência artificial, tudo se une para nos trazer a derradeira experiencia de Halo, como se finalmente o que tinha sido iniciado há 20 anos atrás tivesse agora finalmente sido realizado. A isto muito ajuda a complexidade topográfica de Zeta Halo e a expansividade do mundo, que embora peque por falta de variedade de biomas, oferece em termos de design o palco ideal para as nossas deslocações e fundamentalmente para as batalhas, com o grappleshot como elemento que une e eleva tudo.

Falta-lhe no entanto alguma profundidade no que toca à exploração. Não faltam na net exemplos de easter eggs engraçados - como a montanha com a cara do Craig (o meu favorito) - mas pessoalmente não sou grande fã da natureza auto referencial dos mesmos. Quando estou mergulhado neste universo, descobrir uma maquina de arcada com o jogo do Halo Infinite faz-me sorrir mas também me quebra a imersão. Sobretudo quando quase tudo se resume a esse tipo de piadas, não posso deixar de ficar desiludido. Quando em exploração quero conhecer personagens misteriosas,  templos perdidos, momentos inesperados, não bonecos do Master Chief. Além dos easter eggs temos também uma tonelada de audio logs, que no geral ajudam a contextualizar tudo o que se passa em torno de Zeta Halo, uns mais interessantes que outros, sendo que para mim todos os que pertencem aos Banished são dolorosos de ouvir.  

Isto traz-nos à história, a qual vou tentar não revelar nada de relevante mas onde talvez nada de realmente relevante aconteça. Mas quero dizer que é incrível que tão poucas surpresas tenham sido reservadas para o jogo, com as campanhas de marketing da Microsoft a revelarem demasiado. Por exemplo, quando mesmo no inicio temos a missão de ir recolher a "Weapon" era interessante o jogador ir às cegas, sem o conhecimento antecipado, adquirido extra jogo, de que se trata da nossa nova Inteligência Artificial. É uma narrativa maioritariamente utilitarista, com o fim de mover a história, com personagens a existirem quase exclusivamente como motivadores unidimensionais e onde motivações secundarias são mencionadas de forma meio atabalhoada e superficial, quando muitas vezes mereciam palco central. Podia e devia ter sido a oportunidade para Halo limpar todo o lixo narrativo que tem vindo a acumular, oportunidade desperdiçada. Respeito o lore complexo e vasto de Halo mas não existe motivo para estar sempre todo a ser chamado ao mesmo tempo numa tentativa vã de malabarismo narrativo. Algumas personagens, com os Banished à cabeça, serem como que vindas de um mau desenho animado também não ajuda. Nem não sou fã da forma como a IA é representada. As IAs são dos "seres" mais poderosos do universo Halo, talvez já seja altura de abandonar este protótipo da mulher emocional e tolinha. Por outro lado há um aspecto da escrita, profundamente secundário, e que aqui é um triunfo completo. Um grande jogo revela-se nos pequenos detalhes e todo o trabalho feito nas falas dos inimigos, mais especificamente dos Grunts, é simplesmente incrível. Hilariante e incrível. Um bom exemplo de como não são necessários grandes arcos narrativos para se construir um mundo rico através da escrita. Destaque também para Master Chief naquela que é a minha representação favorita até hoje.

Enquanto escrevo este texto estou a ouvir a banda sonora de Infinite e para minha surpresa é incrivelmente... OK, o que contrasta com a impressão muito positiva com que fiquei durante o jogo. Crédito a quem for responsável pela direção sonora porque realmente é usada de forma exemplar para sublinhar os momentos certos, seja de forma dinâmica enquanto se explora o mundo seja em momentos chave. Mas a nível de som o grande destaque é mesmo para os efeitos sonoros, com as armas a soarem melhor do que nunca - o que não significa muito considerando o paupérrimo trabalho feito pela 343i até à data no que toca ao som - mas mesmo a nível da indústria estamos perante um trabalho de topo. Não só pela escolha e construção dos samples, mas pela qualidade da mistura e mesmo pela integração espacial do som, sendo possível distinguir com exatidão a origem de um ruído sem ajudas visuais.

Na parte gráfica, os sinais estavam presentes desde a revelação em 2020 e Infinite não impressiona. Por muitos que sejam os defeitos da 343i, o aspeto gráfico nunca foi um problema. Halo 4 na X360 era impressionante, superando completamente Halo 3 e mesmo hoje em dia correndo na Series X chega a impressionar. Claro que aqui estamos a falar de um open world, feito para correr na Xbox One original, mas por outro lado seria o grande cartão de visita da Series X e não o é de facto. Competente visualmente, com algumas anomalias que são possivelmente fruto do desenvolvimento caótico mas a correr exemplarmente bem. Mais que tudo é um trabalho inconsistente, onde tão depressa somos impressionados pela qualidade das texturas como prontamente desiludidos pelas sombras que aparecem e desaparecem apenas uns metros à nossa frente.  Depois temos outro problema mais a nível estético, com origem no legado da série, que é a arquitetura simplista das estruturas. Fazia todo o sentido na Xbox original mas com o passar dos anos vai-se tornando um fardo.



Se me perguntassem há um ano qual era a minha opinião quanto a Halo Infinite após a revelação, eu diria que esperava um jogo passável. Melhor que 5, à procura de glórias antigas, mas provavelmente esquecível. Nunca me passou pela cabeça que, mesmo sendo mais que isso, fosse candidato a jogo do ano. Mas aqui estamos. No meio de todo o caos, como que à imagem de Master Chief, um perfeito exemplo de como com persistência, paixão e um pouco de sorte se pode conseguir o impossível. Ao ponto que dou por mim a pensar que talvez fosse boa ideia ter-se adiado o jogo ainda mais um ou dois anos, porque embora excelente, a cada a momento o jogo lembra-nos que ficou perto de ser um clássico intemporal. Ainda assim tenho a expectativa que mais episódios single player sejam adicionados num futuro próximo e que futuros patches possam melhorar a qualidade geral do produto. Mas é impossível ignorar que uma das maiores propriedades intelectuais da indústria chegou ao dia de lançamento com demasiados problemas para serem ignorados.


8.5/10

Jogado na Xbox Series X
Disponível também em PC, Xbox One

        

 P.S. Quero um wingsuit para usar em conjunto com o grappleshot e que deixem a Arkane desenvolver um futuro episódio para Infinite!



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