ANÁLISE - Outriders

 


Outriders surgiu um pouco do nada, looter shooter é um género pelo qual tenho pouco interesse, por invariavelmente me aborrecer de morte, mas com a noticia de que iria fazer parte do Game Pass decidi então, sem grande entusiasmo, dar-lhe uma hipótese. O facto de ser desenvolvido pelo estúdio People Can Fly também não me inspirou grande confiança, ou interesse, sendo Gears of War: Judgement um jogo que falhou em deixar qualquer marca e que é, na generalidade, considerado o pior da série. Mas talvez por partir com tão baixas expectativas acabei por criar as condições ideais para ser surpreendido. Será?

Outriders não tem medo de tomar o seu tempo a construir o mundo, apresentar personagens e criar fundações antes de apresentar o jogador ao combate. Não vou dizer que isto é uma história que vai ficar para os tempos como um marco, ou que vamos para sempre recordar com saudades os seus personagens mas, dependendo do sucesso comercial, pode até vir a ter impacto na cena dos looter shooters pela forma como traz ao género uma história com cabeça, tronco e membros, embarcando o jogador numa espécie de road trip onde um grupo de improváveis aliados parte numa aventura a fim de se salvar a si e ao planeta Enoch, local para onde a humanidade escapou e tenta recomeçar a civilização após ter destruído a Terra. Claro que ao fugir da Terra trouxeram todos os problemas consigo e, em pouco tempo, Enoch está também mergulhado em guerra, caos e destruição. Vamos ver assuntos como colonização, guerra e perda a serem  explorados tematicamente mas que não se espere um tratado filosófico, Outriders está mais perto de ser uma mistura entre um filme de ação dos anos 80 e um jogo do fim dos 00, adaptado aos dias de hoje.


Também na sua jogabilidade demonstra uma identidade algo confusa fruto da fusão de várias ideias dispares e que, talvez quase que acidentalmente, contribuem para o seu sucesso. A menção das palavras looter shooter imediatamente me traz à mente grind incessante e vacuoso, e micro-transações, duas componentes completamente ausentes neste jogo. E embora seja necessária uma ligação online constante, Outriders pode ser jogado simplesmente como um jogo single player onde uma historia guia a sua progressão e embora grind seja puramente opcional e desnecessário, até ao momento desta análise, não existe qualquer opção de micro-transacções. Por outro lado, assume descaradamente a natureza viciante das mecânicas de constante de recompensa típicas do género, inundando o jogador com itens de raridade variável e constantes subidas de nível com as associadas recompensas cosméticas. 

Pode dizer-se que Outriders é o resultado de uma noite escaldante entre Gears e Destiny, mas mesmo isso seria insuficiente para pintar um quadro completo, talvez Doom tenha também participado nesta aventura carnal pelo ritmo frenético e agressividade do combate. A ligação com Gears é talvez a mais interessante, tento o estúdio desenvolvido Judgement, e com o desenho dos níveis tão claramente influenciado pelo estilo cover shooter do mesmo... exceto que aqui a filosofia do modelo de jogo é completamente subvertida. Enquanto em Gears a cobertura tende a ser um porto seguro para o jogador e uma oportunidade de recuperar energia perdida, aqui é frequentemente uma armadilha mortal, com o jogo a recompensar uma atitude agressiva, com a morte dos nossos inimigos a devolver-nos vida perdida, dependendo depois de classe para classe, assim como das nuances de cada build, as condições em como a vida é recuperada.      

O sistema de customização da nossa build oferece muita versatilidade, sendo possível formar sinergias interessantes entre os diversos mods das nossas armas e vestuário, associado ao caminho de progressão escolhido na nossa skill tree -  que se pode redistribuir a qualquer momento sem restrições! - e habilidades exclusivas para cada classe. Por exemplo, o meu personagem tinha um mod em que cada vez que a minha vida caísse a menos de 30% gerava uma explosão que congelava tudo em redor, altura em que eu então ativava uma habilidade que facilmente matava todos os inimigos agora congelados, associado a um outro mod em que aquela habilidade me conferia um nível elevado de energia por cada inimigo morto, dando-me todos os motivos para ser super agressivo e procurar combate de proximidade. O jogo pode também ser jogado em co-op, elevando ainda mais a qualidade do combate com o aumento exponencial das sinergias e soluções táticas entre diferentes classes e builds, e é interessante ver como uma equipa evolui conforme vai aprimorando entre si as suas interações. 

Se o combate de Outriders é de alto nível o mesmo não se pode dizer da exploração, incrivelmente  superficial e que foi despoletando em mim um sentimento crescente de frustração conforme os aborrecidos níveis iniciais foram dando lugar a localizações repletas de mistério a clamar por serem exploradas, sem o jogo ter nada a oferecer nesse aspeto. Mesmo em missões que apresentam alguns elementos de exploração não existe nada como um puzzle ambiental, culminando sempre invariavelmente no mesmo tipo de situações de combate. Embora esses encontros sejam recompensadores e desafiantes, não deixa de ser frustrante quão pouco Outriders tem para oferecer fora do combate.     


Graficamente é um titulo sólido, ainda que dentro dos parâmetros estabelecidos na geração Xbox One/PS4, com o beneficio de correr a 60 frames por segundo e numa resolução elevada na nova geração de consolas. Com o decorrer do jogo e conforme vamos sendo apresentados a novos locais,  vai-se tornando visualmente e artisticamente mais interessante, com as suas florestas tropicais luxuriantes, desertos, cidades esculpidas em encostas, templos ou vilas de arquitetura bebere, convertendo algo que inicialmente ameaçava ser enfadonho e desinspirado numa motivação para descobrir o que a próxima área nos irá trazer. Menos interessante é o trabalho estético a nível do desenho dos inimigos e do design de armas e vestuário, não por falta de qualidade, apenas pela pouca variedade e inspiração com muito pouco a destacar-se.

Também com falta de inspiração mas num grau mais elevado é a parte musical, com composições que vão do mau ao simplesmente estarem presentes, ficando-se frequentemente mais pela intenção do que pretendiam atingir do que efetivamente por alcançarem a tensão ou sentimento pretendido. A nível dos efeitos sonoros é mais positivo, dentro do que se espera no género, com loot drops e subidas de nível a serem assinaladas com sons desenhados de forma a disparar uma resposta positiva do nosso cérebro, qual cão de Pavlov, e um excelente trabalho em tudo o que engloba o desenho sonoro durante o combate.

Onde Outriders se espalha ao comprido, de queixo aberto, dentes caídos e nariz partido é nas cut scenes, onde tudo o que pode correr mal vai correr mal. Screen tearing severo e constante, vozes e sons dessincronizados e um hilariante bug do Unreal Engine onde cada vez que a camara muda para um novo plano o motor de fisica aparenta ficar descontrolado durante o frame inicial, lançando cabelos e roupas em movimentos bizarros, que salta especialmente à vista em momentos mais negros e de solenidade. Problema talvez associado à pandemia e que sem dúvida beneficiaria o jogo se mais algumas semanas, ou meses, fossem tomadas a aprimorar o produto final. Pessoalmente experienciei apenas bugs e glitches menores mas a internet está cheia de testemunhos de jogadores a perder toda a progressão do jogo e loot devido a bugs, assim como na semana de lançamento ter sido perto de impossível encontrar um servidor livre. O que me leva para outro ponto importante; se um jogo é possível de ser jogado completamente a solo, por favor senhores, não obriguem o jogador a estar sempre online!!!   



     

Outriders é uma boa surpresa pela forma como subverte expectativas. Aparenta ser apenas mais uma plataforma de venda de itens cosméticos disfarçado de jogo mas não tem quaisquer micro-transações, torna o grind completamente opcional e desnecessário e parece um clone de Gears of War mas reinventa a fórmula, trazendo um estilo de combate muito mais rápido e visceral onde são os nossos inimigos a precisarem de usar cobertura para se protegerem de nós. A sua componente co-op surpreende pela  profundidade e criatividade convidando o jogador è experimentação. Parece quase acidental, como se várias ideias tivessem sido abandonadas e adicionadas ao longo do seu desenvolvimento, uma manta de retalhos onde tudo o que podia correr mal afinal correu bem. Não é no entanto isento de problemas e precisava de mais tempo para limar arestas e consolidar o que acabou por se tornar no produto final.


7.5/10 

Jogado na Xbox Series X
Disponível também em PC, PS4, Xbox One



 


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