ANÁLISE – Cyberpunk 2077

 

Não vale a pena estar com rodeios. Cyberpunk 2077 é um desastre em forma de jogo, um projecto mal gerido e vitima do seu excesso de ambição. Um produto inacabado com bugs e glitches sem fim. Direi mesmo que é um produto fraudulento pela forma como não cumpriu promessas feitas pelo seu marketing. Mas será que apesar de tudo ainda há um jogo algures entre as mentiras e falhas técnicas ou é simplesmente lixo digital?

No dia de lançamento mal podia conter a minha excitação, finalmente após anos de antecipação Cyberpunk tinha chegado! Infelizmente mal iniciei o jogo vi que algo estava errado e após uma visita ao Twitter tornou-se imediatamente óbvio que não era só comigo... Desisti e esperei por uma atualização, a atualização chegou. Desta vez tinha avançado mais no jogo, completado a primeira missão, onde vi o meu companheiro Jack a atravessar uma porta fechada, continuei até chegar a uma rua onde a frame rate ficou incrivelmente má, olhei para uma montra onde uma stripper dançava com um telemóvel a pairar no ar atravessando o seu corpo ocasionalmente. Mais uma vez desisti. Decidi esperar pelo próximo update para voltar a tentar.

Estávamos então já duas semanas após o lançamento. Desta vez mudei para o modo qualidade, porque em cima de todos os problemas técnicos a qualidade visual em modo performance é atroz. E mesmo eu sendo uma pessoa que dá preferência a frames vs gráficos Cyberpunk fez-me reconsiderar a minha posição, e não me arrependo. Reiniciei o jogo... Jack voltou a atravessar a mesma porta fechada e nesse momento compreendi finalmente que este jogo estava irremediavelmente inacabado, e que iria demorar meses até chegar a um estado de produto finalizado e provavelmente iria sempre apresentar mazelas.



110 horas depois tinha chegado ao fim da minha aventura, de coração nas mãos com a tristeza do meu final e com vontade de imediatamente voltar a Nightcity, começar do zero e mergulhar novamente num dos mundos mais fascinantes que alguma vez experiênciei num jogo. O que se passou então entre o inicio catastrófico e o final eufórico? Na verdade não se passou nada, nada mudou. Apenas com o passar das horas fui adaptando as minhas expectativas e focando-me em tirar o melhor que poderia do jogo.

As missões em Cyberpunk são boas, focadas mais no desenvolvimento da narrativa do que propriamento em gameplay, com grandes momentos que tanto podem ser de pura acção como de intimidade. Embora o sistema de diálogo não seja complexo funciona incrivelmente bem em criar um envolvimento emocional entre personagens e talvez muito ajudado por isso mesmo o leque de pessoas com que nos vamos cruzando durante o jogo é fantástico. E não falo só das missões principais, missões secundárias são frequentemente tão boas ou melhores que as principais mostrando que CDPR se encontra entre os melhores na indústria no desenho de missões e construção de personagens. Infelizmente - e digo isto sem nenhum exagero – em todas as missões encontrei pequenos bugs. Objetos que desapareciam ou se multiplicavam, corpos que atravessavam obstáculos, inimigos que se comportavam de maneiras absurdas, etc. Se há sinal claro que Cyberpunk 2077 foi lançado meses antes de estar pronto é em como até nos momentos mais lineares se encontram pequenas imperfeições próprias de um produto inacabado.

Mas a história são apenas 30 horas para acabar, onde é que passei as restantes 80?

Além das missões principais e secundarias existem dezenas e dezenas de atividades. Estas dividem-se grosso modo em dois grupos. Missões dadas pela policia, que no geral pouca profundidade têm, resumindo-se a matar toda a gente, e que podem (ou devem) ser ignoradas. E missões dadas pelos fixers de cada zona da cidade, que se baseiam geralmente em missões de assassinato, resgate ou sabotagem. Estas últimas impressionam pela quantidade e qualidade, oferecendo uma grande variedade de abordagens graças a um bom level design e, com o evoluir do teu personagem, uma espantosa elasticidade em termos de gameplay. Mesmo no nível mais elevado de dificuldade nunca força o jogador a um só estilo recompensando a experimentação e criatividade. Quando perto do final já me tinha tornado numa espécie de mago digital, capaz de destruir bandos inteiros à distancia, por vezes também optava por entrar de armas em punho saltando acrobaticamente pelo cenário e dizimando todos os inimigos sem que o jogo me punisse por isso. O ciclo de se receber uma missão nova, ler o contexto, estudar o local e executar um plano, é algo que eleva a qualidade de CP2077 apesar de todos os seus problemas. É mesmo admirável a atenção dada a este conteúdo completamente opcional e como os sistemas de progressão encorajam uma abordagem tão variada permitindo que o jogador simplesmente se divirta.



Mas não só de missões viveu o meu tempo a Nightcity. Passei também inúmeras horas em exploração. A impressionante arquitetura e caracterização de cada distrito é um feito incrível. Infelizmente não é um mundo tão rico em segredos como seria desejável mas ainda assim, ler a historia de cada local e depois partir à descoberta é incrivelmente recompensador para qualquer jogador que goste de explorar.

No prazer dessa exploração muito ajuda o incrível trabalho gráfico, onde dos mais pequenos becos ao majestoso centro da cidade com os seus imponentes edifícios tudo é cuidado, detalhado e vibrante. Mas como em tudo neste jogo, também sofre um pouco pela sua inconsistência. A cidade em geral é espantosa mas muitas vezes o streaming de texturas e geometria gera pequenos glitches visuais que comprometem a sua coesão visual, assim como a própria qualidade de algumas texturas deixa muito a desejar. O mesmo problema de inconsistência também afecta os cidadãos de Nightcity com alguns modelos altamente detalhados a contrastarem com a mediocridade dos vulgares transeuntes.


Sonicamente CDPR fez um bom trabalho. O som das armas tem impacto, os veículos em geral soam bem e o ruído ambiente da cidade faz um excelente trabalho em torna-la omnipresente no jogo, como que ela própria uma entidade. A música apresenta uma grande variedade, na forma de estações de rádio, e cobre estilos tão variados como metal, jazz, hip hop, rock, electro, etc. Por norma o jogo não usa muito música como pano de fundo a não ser quando em combate ou para sublinhar momentos particulares em missões, preferindo usar os sons da cidade e as músicas que os seus habitantes ouvem para submergir o jogador. O único ponto negativo que tenho a apontar é a inconcistência na qualidade de som das vozes, com algumas linhas de diálogo ocasionalmente a soarem mal misturadas. 



Cyberpunk 2077 é das experiências mais inconsistentes que já tive com um jogo. Por cada momento que nos deixa surpreendidos pela a sua ambição e execução imediatamente nos desilude com a sua natureza inacabada. Exige boa vontade por parte do jogador para ser desfrutado, mas sinto que não posso recomendar a ninguém neste momento, recomendando antes que se espere uns meses até que seja efectivamente terminado. De um ponto de vista do seu design há uma desconexão entre os seus diversos elementos que provavelmente nunca irá ser totalmente resolvida mas ainda assim sinto que está a um pequeno passo de ser um titulo verdadeiramente lendário, embora de certa forma já o seja mas pelos piores motivos. Talvez tenhamos mais uma bela historia de redenção como aconteceu com outros jogos no passado mas neste momento estamos longe disso. No entanto não deixa de ser um testemunho de todo o seu potencial que ainda assim tenha uma nota positiva.  


6/10

Jogado na Xbox Series X

Disponível em:PC, PS4, Xbox One

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